terça-feira, 1 de julho de 2014

Seres Decisivos

Eu acredito, assim como Nelson Rodrigues, que exista em nossas vidas seres decisivos.
Eu conheci essa afirmação e comecei a acreditar nela depois que, como Nelson, um destes seres se foi.
Um amigo comparou, recentemente, a internet com Jesus Cristo – Antes da Internet/ Depois da Internet – e foi neste segundo período que percebi não ser a única pessoa a não ter mais um ser decisivo na vida.

Qualquer um que me conheça da era Antes da Internet, conhece também o gordo do meu pai. 
Eu sempre falei muito sobre o homem que me criou; que me deu a genética do nariz grande, do cabeção, do humor nonsense e me deu o sobrenome que eu mais amo neste mundo.
Mesmo aqueles que me conheceram na época Depois da Internet, já ouviram falar muito do cara que me ajudou a moldar meu caráter.
Independente de qualquer foto ou postagem que falasse sobre saudade.
Sempre zoei o meu gordelho. Porque a gente se entendia melhor assim.

Foi um caso raro de não dar valor depois de perder. Eu, pelo contrário, sempre tive muito medo que ele partisse.
Tanto era o medo que se não ouvisse o ronco do meu pai à noite, eu entrava no quarto para conferir se ele ainda estava respirando.

Ele me conhecia tanto que eu nunca consegui mentir para ele, por isso, sempre inventava as histórias para a minha mãe – que prefere fingir que acredita, até hoje.
É difícil para qualquer um. Muito mais quando você tem um pai que, ao apresentar o namorado adolescente, ele peida na frente do rapaz só para deixar claro quem manda ali.
Aquele pai que quando vai levar você e suas amigas em um show de reggae, canta no caminho “vou apertar, mas não vou acender agora” para ver se alguém se entrega. (mesmo eu tendo descoberto o que isso queria dizer muito anos depois)

Meu pai era do tipo que saía ajudando todo mundo (contanto que não fosse domingo a tarde, no horário do programa do Silvio Santos). 
Dava carona para desconhecidos, arrecadava doações, ajudava a ter um carro, uma casa própria e, mesmo assim, nunca foi perfeito – o que não me incomoda em nada.
Agora, na era D.I., fico imaginando meu pai no facebook, com seu português ruim e com sua sensibilidade que o fazia chorar vendo os calouros do Raul Gil. 
Eu seria interrompida inúmeras vezes para ver vídeos de superação, de crianças cantando. Além de receber diversas frases de efeito no meu mural diariamente.
Talvez eu bloquearia meu pai. Nunca fui uma filha perfeita.

Outro dia, estávamos olhando fotos antigas na sala e, no meio delas, encontrei esta aqui.
Esta que eu já havia visto inúmeras vezes mas que, pela primeira vez, notei.
Esta que está há dias na minha cabeça e me fez sonhar uma noite inteira com ele.
Esta que me inspirou a escrever esse texto.

Acho que este olhar resume a história de filha que vivi com meu pai.
Este olhar é o que eu sempre vou levar comigo.


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